terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Doentes em coma com alta

São situações dramáticas mas verídicas. Doentes há que, estando internados nos hospitais da Região e em coma, recebem alta clínica. Os médicos pedem às famílias para reunirem condições por forma a cuidarem dos seus doentes em casa, mesmo estando inconscientes e totalmente dependentes.

As famílias entram em estado de choque porque não têm, nem preparação nem condições para tratar dos seus parentes. O Estado também não responde a estes casos, descurando as respostas concretas aos problemas cada vez mais crescentes de saúde e de envelhecimento da população.

Estes doentes são normalmente idosos e foram vítimas de acidentes vasculares cerebrais ou cardíacos. Da parte médica, nada mais há a fazer e nem os doentes precisam sequer de recuperação ventilada. Ocupam, no entanto, uma cama hospitalar que é necessária para casos verdadeiramente urgentes. O hospital não os põe porta fora e lá vai aguentando até que a família encontre soluções. Desnorteada e a lidar com a realidade, esta parte à procura de apoios. E esbarra com grandes dificuldades. As respostas sociais são praticamente nulas e a maioria não se pode dar ao luxo de deixar de trabalhar. Além disso, os parentes não têm preparação para dar as respostas, sobretudo ao nível da enfermagem, mais adequadas.

Médicos dão tempo à família

Foi precisamente um caso deste género que chegou ao conhecimento do DIÁRIO, pela voz de um familiar, no "intuito de alertar as entidades competentes para a solidão e desespero devido à falta de apoios". Recentemente, um idoso deu entrada no Hospital dos Marmeleiros com um acidente vascular cerebral isquémico. O atendimento médico foi imediato. Passadas semanas, o doente continua em coma. A família regista "a forma empenhada e gentil" como a equipa médica acompanha a situação. No entanto, com a mesma delicadeza, a mesma equipa fez ver aos familiares que era necessário criar condições para levar o doente para casa. Os médicos explicam que, apesar do coma, o doente tem alta clínica. O hospital não pode manter uma cama ocupada com um doente cujos cuidados médicos já não são urgentes, além de que corre o risco de ser vítima das bactérias hospitalares, podendo vir a morrer destas infecções. A família, com todos os elementos a trabalhar fora, é confrontada com o drama e procura os serviços do Centro de Segurança Social da Madeira para ver os apoios possíveis. Há que aguardar o atendimento por parte das assistentes sociais encarregues destas áreas, também a braços com inúmeras solicitações. Entretanto, prevalecem mais as dúvidas do que as respostas: "Como ter este doente em casa? Será que uma empregada dá conta deste serviço ou é necessário uma enfermeira? Quem paga estas despesas? Como explicar aos filhos mais novos a situação de ter em casa um doente praticamente morto, a alimentar-se por uma sonda e sem sequer abrir os olhos?..."

A Região dispõe de uma rede de cuidados continuados de saúde, mas, segundo explicou ao DIÁRIO o seu responsável, França Gomes, apenas para casos com potencial de recuperação superior a 65%. Não é a situação em foco, cuja recuperação está clinicamente demonstrada como impossível.

Casos como estes têm tendência para aumentar nos hospitais da região, quer nos Marmeleiros quer no Central do Funchal. Aliás, um dos andares já quase é reservado a estas altas problemáticas. No entanto, médicos e enfermeiros são unânimes em declarar ao DIÁRIO que "os nossos hospitais deveriam dispor de unidades de retaguarda para acudir a situações deste melindre."

Faltam aos hospitais unidades de retaguarda para acolher estes doentes, dependentes e sem hipóteses de recuperação. foto arquivo/joana sousa Menos túneis e mais saúde

O DIÁRIO ouviu ainda vários médicos que, para evitarem melindres com a hierarquia, preferiram não ser nomeados nesta reportagem. No entanto, consideram que "a Região deveria investir ainda mais na saúde e menos em políticas eleitoralistas." Em termos concretos, sugerem "a construção de infra-estruturas capazes de responder aos problemas que se colocam aos doentes que ficam dependentes de terceiros e cujas famílias não têm condições para os ter em casa, nem têm vaga nos lares."

Alguns médicos mais experientes desta praça sugerem: "Em vez de se investir avultadas somas nos túneis e nas sociedades de desenvolvimento, talvez fosse mais útil equilibrar o investimento na parte social, nomeadamente na saúde. É que as respostas que se colocam aos idosos não são suficientes e a situação torna-se ainda mais preocupante quando estão em questão casos de doentes com alta clínica mas que exigem múltiplos cuidados."

A ficar nos hospitais, segundo também nos afirmam, estes doentes crónicos acabam por morrer de pneumonia ou de outro vírus hospitalar, que habitualmente oferecem grande resistência aos antibióticos.

Entidades compreendem mas não têm soluções na manga

Segurança Social
A presidente do Centro de Segurança Social da Madeira declara ao DIÁRIO que não tem conhecimento de casos desta natureza. No entanto, Bernardete Vieira explica que os apoios da Segurança Social disponíveis não variam daqueles que são do conhecimento comum do cidadão. Quer isto dizer que há a ajuda domiciliária, que assegura o banho ao doente, e uma comparticipação para pagar o cuidador, que varia consoante os rendimentos das famílias.

Direcção hospitalar
O presidente do conselho de administração da empresa que tutela a saúde (SESARAM) explica que os casos de doentes em coma com alta hospitalar "não são muitos mas existem." Passam do "estado de agudos a doentes crónicos, já não precisam de recuperação assistida nem ventilada e o hospital dá tempo às famílias no sentido de estas cuidarem dos seus doentes." Almada Cardoso afirma que "há famílias sem condições para os tratar, mas há outras que o fazem e durante anos".

Rosário Martins

Fonte : Dnotícias Online

2 comentários:

  1. Não quis deixar meu comentário na própria mensagem porque uma informação como esta merece um espaço só seu.
    No entanto é de lastimar estas situações, cada vez mais os idosos necessitam de mais cuidados, cada vez mais nossa faixa etária é envelhecida, cada vez mais trabalham as mulheres fora de casa, cada vez mais é difícil responder aos apelos de nossos pais, avós, tios, padrinhos , cada vez mais fica a mágoa de saber que um dia também nós lá chegaremos e um dia poderemos estar na mesma situação.

    Eu cuidei por uns tempos da avó de meu marido, uma senhora sem condições algumas e doente, cuidei dela durante sete meses, privei-me de sair com a família, não podia ir a casa demeus pais nem irmãos, meus filhos já reclamavam minha atenção, a avó também reclamava logo se me visse a brincar com os meus filhos, na hora de comer nunca sabia o que queria, queria tudo e não queria nada, não suportava uma única dor dela, tudo doía, exigia que eu lhe tirasse as dores e eu sentia-me impotente, ela exigiu tanto de mim que acabei tendo uma forte depressão, pedi apoio social, mas o único dado era dois dias por semana dar-lhe o banho, mas isso não me servia ela banhava-se todos os dias.
    Os centros de dias estavam cheios e pagando também saía um pouco pesado, ela melhorou, acabei levando de volta a sua casa, com mágoa de saber as mentiras e calúnias que levantou sobre mim e minha família quando ainda morava comigo e depois de ir para seu espaço.

    Eu tentei dar-lhe as melhores condições possíveis em casa dela, falei nos serviços sociais para o apoio a ela, falei no centro de dia e preparei sua ida , mas caro teria gastos que ela não queria ter, acabou não indo, entretanto foi internada no hospital dos marmeleiros e lá continua, foi abandonada, mas para o bem dela, lá sei que está bem, apesar de também saber que rouba o espaço de outra pessoa.
    Não critico quem o faz, acho triste o abandono, mas minha família também não o merecia em especial meus filhos que andavam tristes e revoltados, eu não merecia porque sempre tentei dar o melhor para ela, e a verdade é que não era só meu marido que era seu neto, tinha e tem mais, mas nunca ninguém me apoiou, depois de a levar para casa começaram a aparecer tios e netos que até desconhecia, criticaram, mas ninguém a levou ou quis cuidar dela nem um dia por semana, ela está internada e nunca a foram visitar, mas sei que já tentaram alterar a morada de reforma. Enfim...

    Sei que um dia lá vou chegar, não quero ter o mesmo fim que ela e outros tantos, mas sei que a probabilidade é essa.

    Os Serviços Sociais deveriam criar mais centros de dia especialmente, deveriam dar apoio nocturno aos doentes a partir de uma certa idade e que vivem sós.

    Os Velhinhos não precisam apenas de dois banhos por semana, eles precisam muito mais que isso.
    Prefiro uma velhice sem reforma mas com um espaço e condições para sobreviver, a maioria da reforma é para a família ficar e brigar..

    Pensem nisso, ajudem essas pessoas viver sem dinheiro.

    Márcia Neves

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  2. Marcia,
    Sou Brasileira, vivo no Rio de Janeiro. Também tive um problema semelhante. Meu marido aos 42 anos, entrou em coma após uma anoxia cerebral.
    Permaneceu 2 anos e 4 meses em coma, antes de morrer e durante este tempo, fora os 2 últimos meses, cuidei dele com todo meu amor, muitas vezes com ajuda e muitas vezes só.
    Também fui condenada por te-lo internado em seus 2 últimos meses de vida e por ter me relacionado com o médico que o cuidava.
    nNa época eu tinha 40 anos, não havia previsão para minha situação, eu seria viuva de marido vivo por quanto tempo?
    Faz 10 anos que meu marido morreu e até hoje ainda sinto a dor de sua perda e da solidão dos momentos em que eu o cuidava.
    Se vc quiser, posso enviar por e-mail um pequeno "escrito" sdobre esta experiência.
    Meu e-mail é ianecaf@gmail.com.
    Terei prazer em partilhar com vc e com quem mais quiser meu "desabafo", como chamei o que escrevi.
    Receba o meu abraço, Iane Franco

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